site2 copy1574A auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) divulgada na Gazeta do Povo de ontem, 07 de janeiro, confirma o óbvio: 4 grandes hospitais públicos do Paraná padecem da falta de funcionários. A auditoria do TCU foi realizada em meados de 2013, abrangendo o Hospital de Clínicas da UFPR (mantido pelo governo federal) e os Hospitais Universitários da UEPG, Unioeste e UEM (mantidos pelo governo estadual), mostrando que o problema da saúde pública é geral. Em alguns casos, os números são gritantes, como na UEPG, onde o hospital opera com apenas 60% da sua capacidade de atendimento.

Mas a divulgação do relatório do TCU, de julho de 2013, neste momento, não pode ser entendida como mais uma reportagem do principal jornal do Paraná. Em dezembro, o governo Beto Richa (PSDB) apresentou projeto para a criação da Fundação Estadual de Atenção à Saúde do Paraná (Funeas), propagandeada como solução para o problema do déficit de trabalhadores. O projeto ia ser aprovado rapidamente, mas uma mobilização organizada por sindicatos de trabalhadores do serviço público estadual barrou as intenções governistas e a votação foi adiada para fevereiro.

A reportagem da Gazeta parece em sintonia com as intenções do governo estadual, pois aponta, claramente, que a Fundação pode ser uma solução para os problemas da saúde estadual. Como prova de que a Fundação é “o que faltava” no estado do Paraná, há uma pequena entrevista com o diretor-geral da Fundação que faz a gestão da saúde de Curitiba (FEAES), Gustavo Justo Schulz. Segundo o diretor-geral, a Fundação permite maior flexibilidade para contratações e é fiscalizada pelo Conselho Curador, Secretaria Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Saúde e Tribunal de Contas do Estado. Segundo ele, essa fiscalização garante que não haja privatização do SUS.

Mas a resposta do diretor-geral da Fundação curitibana e as argumentações dos demais defensores da proposta, sejam eles partidários do PSDB/DEM (governo estadual) ou do PDT/PT/PCdoB (governo municipal e federal), esconde a “vida real” do funcionamento das Fundações Estatais de Direito Privado – FEDP (modelo de gestão da FEAES e da Funeas).  Tudo aquilo que é “vendido” como uma inovação a ser feita pela Fundação, são questões que a administração direta já tem capacidade para resolver.

Não é preciso Fundação para pagar melhores salários aos trabalhadores, para haver planejamento na gestão, para haver fiscalização pelo controle social e outras instâncias. Para todas essas situações, é possível fazer via administração direta.

Outro ponto levantado pelos defensores da “flexibilização da gestão” é a questão da licitação. Os gestores dizem: “não posso esperar 3 meses para comprar uma seringa, que é artigo de urgência”. Aqui é mais um ponto onde falta muita informação. Primeiramente, é preciso dizer que a própria lei de licitações permite compras de urgência. Ainda vale dizer que o que falta, na maioria das vezes, é planejamento e financiamento e isto é que está na raiz na falta de materiais. Além disso, é preciso registrar que as Fundações são obrigadas a comprar por licitação.

Mas há coisas que a administração direta não permite ou é limitadora e que a Fundação permite. É aqui onde encontramos os verdadeiros motivos, muitas vezes não verbalizados pelos defensores do modelo de FEDPs. A Lei Orgânica da Saúde limita a contatação de serviços privados de saúde por parte do poder público (administração direta), o que não acontece com a Fundação. Com este modelo é mais fácil, por exemplo, contratar laboratórios privados para a realização de exames, comprando serviços que poderiam ser executados pelos laboratórios públicos. Aquilo que atualmente é uma exceção, vai virar regra ao longo dos anos.

Além disso, na Fundação não há concurso público e os trabalhadores passam a ser contratados via CLT, a partir de processo seletivo. Portanto, os novos trabalhadores não tem direito àquilo que os trabalhadores concursados conquistaram ao longo de mais de 30 anos de muita luta, como jornada de 30 horas semanais, plano de carreira, estabilidade, entre outros pontos. Mas não pense você que esta é apenas uma discussão corporativa por parte dos sindicatos. No serviço público, a estabilidade da equipe de trabalhadores é muito importante para a qualidade do serviço. Na saúde, a estabilidade é também terapêutica, especialmente em áreas de tratamento contínuo. Por isso, defender um mecanismo de contratação que garante a estabilidade dos trabalhadores é garantir um atendimento mais qualificado aos usuários do sistema.

O relatório do TCU espertamente divulgado pela Gazeta do Povo neste mês de janeiro é mais um ponto da batalha em defesa dos serviços públicos e contra o modelo de fundações. Esta batalha terá um ponto alto na luta contra o PL 726/13, que deve ir a votação na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) já no mês de fevereiro. É preciso que toda a sociedade se envolva neste processo e mostre que a ALEP não pode decidir algo de tamanha importância de costas para os interesses da maioria da população, mais uma vez.