ebserhA pedidos, escrevo breves linhas sobre porque o Conselho Universitário da UFPR deve manter sua posição contrária a adesão à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).

Primeiramente, é preciso dizer que há sim uma crise nos hospitais universitários federais brasileiros e que o Hospital de Clínicas da UFPR é parte dessa crise. Faltam insumos e recursos humanos, sobram filas e reclamações. Mas essa não é apenas uma crise de gestão ou de um modelo de gestão. É, especialmente, uma crise financeira, visto que os hospitais funcionam há muito tempo em déficit. O HC da UFPR tem déficits mensais de cerca de R$1 mi, conforme material distribuído pela Associação de Amigos do HC (AAHC). Não é possível gerir um hospital de maneira adequada com um déficit mensal deste tamanho.

Das 4 fontes de sustentação (recursos humanos, pesquisa, procedimentos via SUS e estrutura física) de um hospital universitário, pelo menos 2 estão falhas há muitos anos.

Desde a metade dos anos 1990, não são realizados concursos públicos para uma série cargos que foram terceirizados, como motoristas, seguranças, cozinheiras, entre outros. Mas essas funções continuam existindo no cotidiano do hospital e por isso os trabalhadores para tais funções são contratados por fundações de apoio (como a Funpar) ou por empresas terceirizadas. Neste caso, os trabalhadores deixaram de ser pagos pelo MEC (como aqueles contratados via concurso público) e as universidades tem que “se virar” para pagar os “fundacionais” e/ou terceirizados, gerando uma parte do déficit citado acima. Além disso, são diversos os procedimentos da chamada “tabela SUS” que não tem reajuste. Isso significa que o hospital realiza o procedimento mas não recebe repasse financeiro suficiente do SUS para pagar tal procedimento.

Para resolver essa situação, é preciso atualizar a tabela de procedimentos do SUS e recompor o quadro de funcionários via concurso público, evitando que os hospitais usem dinheiro que deveria ser usado para pesquisa ou na estrutura física para o pagamento de trabalhadores. Por isso que os hospitais tem hoje uma estrutura sucateada e sobrevivem a base de doações, através de programas como o “HC Conta com Você”.

Foi esta análise que embasou o posicionamento do Conselho Universitário da UFPR em 31 de março de 2011, quando aprovamos (eu estava como conselheiro na época) por unanimidade uma moção de repúdio a então Medida Provisória nº 520/10 (clique aqui para acessar esta moção).

De lá pra cá, a situação piorou para os hospitais universitários (HU’s) brasileiros. Isso porque o governo federal impôs a “sua solução” para a crise dos HU’s, que é a contratação da EBSERH por cada hospital. Esta não pode ser considerada uma solução efetiva visto que não há indicativo de novos recursos financeiros para os hospitais. Além disso, os concursos que a EBSERH já abriu em outros locais não estão contratando motoristas, cozinheiras, seguranças e outros serviços que hoje estão terceirizados.

Mas o interesse maior na aprovação da EBSERH está entre aqueles que tem negócios na área da saúde. Isso porque a EBSERH vai legalizar uma série de situações que hoje ocorrem por conta de brechas jurídicas. Uma delas é a “compra de serviços e procedimentos”, que será facilitada por uma entidade como a EBSERH. Atualmente, os HU’s deveriam estar equipados com uma estrutura capaz de fazer exames como tomografias e outros procedimentos caros e complexos. Como não tem estes serviços, os HU’s compram na iniciativa privada, o que garante altos lucros para os “empresários da saúde”. Com a EBSERH, isso será a regra e não mais a exceção.

Mas, apesar de tudo isso, a maior parte das universidades brasileiras aceitou a EBSERH e o governo federal está pressionando a UFPR para que faça a adesão, pressão essa que se dá de maneira política e financeira, com anúncio de corte de recursos e verbas. É nesse clima que parte dos membros do COUN da UFPR tem “mudado de posição” e afirma que a única saída para o HC é a EBSERH.

É preciso que fique claro que isso não é verdade. O exemplo vem da maior universidade federal brasileira (a UFRJ), que conta com 7 hospitais universitários. Nela, o Conselho Universitário aprovou que, para suprir a falta de funcionários, devem ser convocados todos aqueles trabalhadores aprovados em concurso para as áreas de saúde. É possível fazer isso na UFPR, pois há concursos abertos para enfermeiro, técnico em enfermagem, auxiliar em enfermagem e para vários cargos de médico, que são as áreas onde a falta de recursos humanos é mais gritante.

A escolha da UFRJ mostra que há sim alternativas antes da “toalha ser jogada”. É possível resistir por mais tempo em relação a implantação da EBSERH, que vai facilitar a mercantilização da saúde, além de outros problemas, como a desvinculação em relação a universidade, que prejudica os estudantes da área.

A manutenção do posicionamento contrário da UFPR em relação a EBSERH pode reacender este debate nacionalmente e incentivar a reversão do processo de implementação da empresa, que sofre contestação jurídica e política em diversos locais.

(para saber sobre a crise dos Hospitais Universitários, clique aqui).