meia greve

Publicado originalmente no Blog Amenidades

Em tempos de greve de professores das universidades, sempre surgem aqueles que usam os mais diversos argumentos para deslegitimar o movimento e furar a greve. Fingindo uma preocupação com os estudantes, vários professores mantém suas aulas, desrespeitando a decisão coletiva e causando, aí sim, um verdadeiro prejuízo aos estudantes, que tem que assistir aulas durante a greve e depois na reposição de aulas.

Mas, certa vez, na UFPR, nos idos de 2004, houve uma das maiores “furadas de greve” da história. Perto dela, ir dar aula em dia de greve virou algo banal. Se você acha que seu professor é um grande pelego por estar indo dar aulas, leia essa história. Você vai ver que ele não chega nem perto do que um grandioso fura greve pode fazer. Você vai ver que nem como fura greve ele é destaque.

Em meados do primeiro semestre de 2004, os professores das universidades federais, em campanha salarial, decidiram por paralisar suas atividades por 24h. E, na UFPR, uma assembleia docente aprovou a paralisação. No Departamento de Comunicação (DECOM), os professores, apesar de não estarem na assembleia, optaram por acatar a decisão e decidiram não dar aulas no dia da paralisação. Por conta disso, o prédio do DECOM, localizado no campus Juvevê, nem foi aberto naquela dia.

Mas os calouros tinham, naquele dia, aula de História Contemporânea, com um professor do Departamento de História (DEHIS), local onde a paralisação não ia ser seguida. E como os calouros ainda não estavam muito ligados na dinâmica da universidade, a maioria esteve presente no DECOM naquele dia de paralisação. E por lá encontraram seu professor do DEHIS. E aí que as coisas só foram piorando…

Os estudantes estavam lá, o professor também mas… o prédio tava fechado. Foi então que surgiu uma brilhante ideia: dar aula no CACOS (Centro Acadêmico de Comunicação Social), que fica numa sala dentro do espaço do campus, mas com acesso independente ao prédio onde são a maior parte das aulas. Todos acataram a ideia.

Chegando ao CACOS, novo desafio: como ministrar uma aula sem quadro negro e giz? “Não há problemas”, disse um aluno, que trouxe uma nova brilhante ideia: usar a mesa de ping-pong como quadro e o giz da sinuca como… giz. Pois bem, a aula começou!

Quando ela já estava encaminhando-se para o fim, o professor sugeriu que iria começar um conteúdo novo. Num lapso de bom senso, um aluno se levantou e argumentou que isso não deveria ser feito, visto que alguns calouros não tinham vindo por conta do aviso da paralisação e que não poderiam ser prejudicados, etc. Outros se levantaram, provavelmente os mesmos que haviam matado aula na semana anterior, falando que estavam ali e que tinham direito a assistir a aula até o fim.

Pois bem… como ali estavam pessoas muito democráticas e respeitadoras das decisões coletivas, foi feita uma votação na sala, se o professor deveria ou não dar um conteúdo novo. O resultado da votação? Não importa. Ali o principal resultado já estava colocado: uma grande aula do que não fazer quando se está diante de um movimento reivindicatório legítimo de trabalhadores.

Nota final: a lembrança desse triste episódio de 11 anos atrás não é um álibi para os atuais e convencionais fura-greves. Serve apenas para lembrar como essa prática é ridícula, ainda mais vinda daqueles que explicam, em suas aulas, como o movimento dos trabalhadores foi responsável por diversas conquistas sociais, democráticas e trabalhistas ao longo da história.