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16Esse foi texto foi escrito em parceria com Julio Cesar Gonçalves da Silva*

No final do ano de 2013, uma fala comum sobre o ano que estava chegando, 2014, era de que ele iniciaria uma fase de “anos rápidos”, devido a Copa do Mundo e as eleições em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Em 2015, iríamos “enforcar”. Dois anos depois, ao terminarmos 2015, vemos que a realidade foi totalmente diferente.

Lendo as postagens de redes sociais e artigos em jornal, há quase um consenso de que 2015 foi uma porcaria. E, sabemos, que um consenso tem sido difícil no Brasil nesses tempos de polarização. Mas, do nosso círculo de amigos do Facebook a colunistas liberais do jornal Gazeta do Povo, todos reclamam do ano de 2015. Por um lado, fala-se na morte de diversos artistas, tragédias e crimes ambientais, retrocessos em direitos sociais e trabalhistas. Por outro, a reclamação de que Dilma ainda não caiu.

Mas, indo um pouco na mesma linha do que escreveu Marcelo Freixo em sua última coluna desse na Folha de S. Paulo**, gostaria de dizer que o ano de 2015 não foi ruim: ele foi intenso! E essa parece ser uma característica que veio pra ficar no Brasil após os acontecimentos que ficaram conhecidos como “Jornadas de Junho”, em 2013. De lá pra cá, o Brasil saiu do marasmo político e entrou para uma nova fase, em que as disputas políticas estão mais acirradas e, principalmente, polarizadas (sobre este tema, é bem importante ler as contribuições do professor Marcelo Badaró, como essa que você lê clicando aqui).

Não ache, portanto, que 2016 será diferente, isso porque as veias abertas com junho de 2013 estão longe de se fecharem por aqui. E isso quer dizer que teremos mais um ano com projetos conservadores em pauta, com muitas lutas sociais, com manifestações “coxinhas”, greves, brigas no Facebook. Enfim, com a “boa e velha” luta de classes.

Para mostrar como 2015 foi intenso e não teve apenas notícias ruins, seguem aqui alguns momentos marcantes:

1) Greves no serviço público do Paraná,  com duas ocupações da ALEP: eleito em primeiro turno com 55% dos votos e dono de uma base aliada de 48 deputados (entre 54) , Beto Richa parecia invencível. Mas uma forte greve dos trabalhadores do serviço público estadual (especialmente professores e funcionários de escola, de docentes e estudantes das universidades estaduais, trabalhadores da saúde e agentes penitenciários) mostrou que nossa classe unida é mais forte do que qualquer base aliada. Os parlamentares foram encurralados com fortes mobilizações, incluindo duas ocupações na Assembleia Legislativa. Após 1 ano de seu segundo mandato, Beto Richa é um dos governadores mais mal avaliados do Brasil.

2) Ocupações das escolas pelos estudantes em São Paulo (e, em menor medida, em Goiás): ameaçados pelo fechamento de mais de 150 escolas, os estudantes do ensino médio de São Paulo deram uma aula ao Brasil, ocupando as escolas, mostrando que os estudantes querem mais do que um diploma. O governador Geraldo Alckmin teve que recuar e o secretário de Educação pediu demissão. Foi a primeira vez, em mais de 20 anos de tucanato paulista, que um governador do PSDB sofreu desgaste em sua imagem. Como bem colocou Vinícius Prado, na área da educação, a resposta ao ajuste fiscal veio das ruas. Em Goiás as mobilizações seguem firmes, contra a transferência da gestão das escolas para a PM e para Organizações Sociais.

3) Fracasso das últimas marchas proto-fascistas apoiadas pela grande imprensa no Brasil: em março de 2015, mais de 1 milhão de pessoas foram as ruas pedindo a saída de Dilma. Mas o que mais chamou atenção desses protestos foi a presença (que acabou hegemonizando o movimento) de segmentos que defendem a volta da ditadura militar e outros absurdos. Apesar de continuarem fortes, esses movimentos foram se enfraquecendo ao longo do ano, tanto por estarem associados a Eduardo Cunha, quanto pelos motivos pelo impeachment terem se mostrado mais fruto de uma disputa política mesquinha entre PT e PSDB, do que de fato uma discussão sobre rumos diferentes para o país.

4) Grandes manifestações contra Eduardo Cunha (com destaque à participação das mulheres): a partir da aprovação (em primeira instância) de projetos que atacam direitos das mulheres e das LGBT, milhares de pessoas foram as ruas pedindo a rejeição desses projetos e a saída de Cunha da presidência da Câmara. Essas manifestações tiveram um protagonismo muito grande de mulheres e de novos grupos feministas. As revistas semanais tiveram que reconhecer a força do movimento: a Época chamou o movimento de “A Primavera das Mulheres” e a IstoÉ denominou como “O Grito das Mulheres”. Esse protagonismo feminista também foi visto em campanhas virtuais como #meuprimeiroassedio e #meuamigosecreto.

5) Vitória da Syriza: em janeiro, a Coalizão da Esquerda Radical (Syriza) venceu as eleições gerais na Grécia, ficando a poucos votos de conseguir maioria absoluta no parlamento. Apesar da (até previsível) traição posterior, com a aceitação das imposições da Troika, a vitória da Syriza mostrou que é possível termos vitórias eleitorais da esquerda radical.

6) Bons desempenhos eleitorais do Bloco de Esquerda (Portugal) e Podemos (Espanha): as eleições legislativas chegaram a um impasse em Portugal e Espanha, visto que nenhum partido conseguiu maioria para eleger um primeiro-ministro e governar. Esse impasse significou uma derrota da direita tradicional (que estava no poder em ambos os países) e da social-democracia (ou nova direita), que não conseguiu se colocar enquanto uma alternativa. E isso aconteceu, principalmente, devido ao crescimento do Bloco de Esquerda em Portugal e do Podemos na Espanha. Além do crescimento do Podemos e do fim da hegemonia do PSOE e do PP (que se alternavam no poder na Espanha desde 1978) nas eleições gerais (chamadas por lá de eleições estatais, visto que são eleições do Estado espanhol), também vimos a vitória de candidatas de esquerda nas prefeituras de Barcelona e de Madrid.

7) Mudanças no Partido Trabalhista inglês e presença socialista no Partido Democrata estadunidense: ainda no âmbito internacional, o ano de 2015 foi marcado também pela mudança radical no comando do Labour Party (Partido Trabalhista inglês), que passou a ser presidido por Jeremy Corbyn, um deputado de atuação anti-austeridade. Já nos EUA, a surpresa está com a boa presença de Bernie Sanders, que se declara socialista, nas prévias do Partido Democrata; até o momento, é Sanders quem que vem ameaçando a vitória interna de Hillary Clinton, que parecia fácil. Por lá, a polarização também se mostra cada vez mais aguda, visto que quem lidera entre os republicanos é Donald Trump, que é tão conservador que assusta até aos conservadores estadunidenses.

8) Aprovação do casamento homoafetivo pela Suprema Corte dos Estados Unidos, por referendo popular na Irlanda e pelo parlamento grego e finlandês: em diferentes momentos, de diferentes formas, isso também marca o avanço em uma pauta de extrema importância para milhares de pessoas e ajuda no combate a LGBTfobia, ainda tão forte e causadora de tantas mortes pelo mundo.

9) Grandes marchas contra a mudança climática em várias cidades do mundo simultâneas ao COP 21: durante a Conferência da ONU sobre o Clima em Paris, manifestações pelo mundo inteiro pediram soluções mais firmes e definitivas sobre o tema. Mais uma vez, a Conferência pouco decidiu.

*Julio Cesar Gonçalves da Silva é mestre em Sociologia pela UFPR e professor da rede estadual de educação do Paraná.

**Já tinha pensado em escrever esse texto antes da coluna, a partir de uma provocação do Júlio no Facebook, mas sei que ninguém vai acreditar nisso.