Beto Richa, governador do Parana, em coletiva para a imprensa sobre o confronto da policia com professores grevistas no Centro Civico em CuritibaEntre os meses de março e abril, presenciamos algumas manifestações de rua que pediam a saída de Dilma Roussef da presidência da República. Organizadas a partir de pequenos grupos de ultra-direita e contando com o apoio da mídia corporativa e de políticos da oposição de direita (basicamente do DEM e do PSDB), essas manifestações juntaram milhares de pessoas e foram palco de reivindicações bastante conservadoras, como a separação da região Sul do restante do Brasil e a volta dos militares ao poder.

O conjunto da esquerda organizada foi contrário a essas manifestações, por compreender que o foco de nossa luta em nível nacional deve ser o combate ao ajuste fiscal e econômico promovido pelo governo Dilma. Apesar de todos verificarem que as manifestações também contaram com a presença de trabalhadores e de setores da juventude indignados com os rumos da política brasileira, a liderança dessas passeatas tinha um cunho claramente conservador e contrário as pautas dos trabalhadores.

O movimento do “Fora Dilma” teve muito mais um aspecto revanchista, de quem perdeu as eleições. De tão genérico, permitia o aparecimento e participação de movimentos de ultra-direita, em nada interessados nas pautas dos movimentos sociais. Se é verdade que o governo federal é indefensável (por conta do corte em direitos sociais e trabalhistas, do corte no orçamento da educação, etc), é também verdade que os movimentos de 15 de março e 12 de abril não são alternativa a política que é hegemônica no Brasil.

Quase paralelamente a isso, vivemos no Paraná um cenário de intensas lutas, que vem desde fevereiro questionando fortemente o governo estadual de Beto Richa (PSDB) e colocando nosso estado como protagonista das lutas sociais no Brasil. Num cenário cheio de contradições, pois foram também por aqui que as manifestações do “Fora Dilma” foram bem cheias, é possível dizer que há um fortalecimento das lutas dos trabalhadores e da juventude no Paraná.

Nesse contexto, desde fevereiro temos escutado nas manifestações a palavra de ordem “Fora Beto Richa”. E o que parecia algo muito distante, passou a se tornar possível a partir das duas ocupações da ALEP em fevereiro e do episódio da bancada do camburão. Ali ficou claro que Beto Richa não tinha mais condições de governar e que seu mandato iria se “arrastar” nos próximos anos. Depois disso, tivemos a divulgação de pesquisas apontando a desaprovação recorde do governador, as denúncias de corrupção e pedofilia envolvendo assessores, a perseguição a jornalistas e o descumprimento dos acordos que possibilitaram, em março, o fim das greves dos trabalhadores do serviço público estadual. Por fim, o massacre do dia 29 de abril, com o cinismo característico dos tucanos para justificar o ocorrido.

Após o 29A, as manifestações de questionamento a Beto Richa se intensificaram. Já no dia 30 de abril, vários atos aconteceram em Curitiba e em cidades como Londrina, Paranavaí e Guarapuava. No dia 01º de maio, mais de 10.000 pessoas no ato público em Curitiba, onde a palavra de ordem pedindo a saída de Beto Richa foi novamente gritada. Em outras cidades do estado, também tivemos atos massivos e com o mesmo caráter. No dia 02 de maio, a cidade de Maringá presenciou a primeira manifestação que pedia, na sua convocatória, a saída de Beto Richa. E ela foi um sucesso: mais de 1000 pessoas presentes, em pleno feriado.

Na semana seguinte, o que vimos foi um governo atordoado, com a demissão do secretário de educação e com a novela em torno da secretaria de segurança pública, com a saída-retorno-saída de Francischini. Pra terminar a semana, um julgamento simbólico dos acontecimentos do dia 29 de abril, em que dois juristas (Jorge Luiz Souto Maior e Celso Antônio Bandeira de Mello) mostraram que há argumentos também no campo jurídico para a saída de Beto Richa.

Esse relato todo já mostra as diferenças da campanha que pedia a saída de Dilma e da campanha, ainda dispersa e desorganizada, pelo Fora Beto Richa. O que temos visto no Paraná é um movimento muito ligado aos interesses dos trabalhadores, que liga a saída de Beto Richa com a reversão da reforma da previdência aprovada sob tiros e bombas (PL 252/15), do tarifaço de dezembro (que aumentou impostos e taxou os aposentados), a defesa de serviços públicos de qualidade e o combate a repressão policial.

Sob o aspecto político, o Fora Beto Richa é absolutamente legítimo. É nossa tarefa fazer com que essa campanha se espalhe pelo estado todo, com a criação de comitês populares, realização de debates, etc. É preciso ocupar esse espaço, aproveitando para levar os pontos de debate que citamos acima, fazendo com estas demandas estejam na “boca do povão”. Caso não façamos, outros irão ocupar este espaço.

Mas há ainda os aspectos jurídicos, em que temos que atuar num campo mais espinhoso. Segundo a argumentação de vários juristas e advogados, além da representação na Procuradoria Geral da República para que investigue o governador, feita pelo PSOL, é possível pedir o impeachment de Beto Richa por sua responsabilidade no massacre de 29 de abril. O trâmite para isso prevê a apresentação do pedido na Assembleia Legislativa. Ou seja, são os deputados estaduais, aqueles que em sua maioria fizeram parte da bancada do camburão, que irão votar se este pedido é procedente ou não. Se votarem sim, o pedido segue adiante. Se votarem não, mostrarão mais uma vez que estão de costas para a população paranaense. Dessa forma, não há o risco de ingressarmos com uma ação e a derrota dela servir para um novo fortalecimento de Richa.

E, se Beto Richa cair, o que acontece? Nos aspectos formais, quem deve assumir é a vice, Cida Borghetti. Mas se a queda se der pela pressão política, é evidente que Cida também não terá condições de assumir, muito menos Ademar Traiano (presidente da ALEP) e o presidente do Tribunal de Justiça, que seriam os próximos na linha sucessória formal.  E me parece que no âmbito jurídico a situação é a mesma, visto que a responsabilidade do massacre também é da vice, do presidente da ALEP e do TJ.

Considerando o que expusemos aqui, não há o que perder com a campanha Fora Beto Richa. O cenário atual do Paraná abre um espaço para discutirmos a legitimidade de governos e instituições “democráticas”. É dever dos socialistas se inserir nessas lutas de questionamento progressivo das instituições, contribuindo para saltos de consciência que fortaleçam a certeza de que somente a auto-organização das trabalhadoras e trabalhadores pode mudar a vida. E que aqueles que atacam os direitos de nossa classe e a reprimem com violência devem saber que não passarão! É preciso ir as ruas, para derrotar definitivamente esse governo, para que os trabalhadores e a juventude mostrem sua força e para que nenhum outro governo ouse repetir as ações de Beto Richa.