1374534088No último dia 23 de setembro, a notícia da renúncia de Cleyton Camargo do cargo de presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) surpreendeu a todos e todas. Em meio a uma investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por denúncias de tráfico de influência e venda de sentenças, a renúncia soou quase como uma confissão de culpa.

Mas engana-se quem pensa que o gesto de Cleyton Camargo significará uma nova fase para o Poder Judiciário paranaense. Com sua renúncia, haverá um novo processo eleitoral para a presidência do Tribunal de Justiça, onde apenas os desembargadores tem direito a voto. Sim, isso mesmo, nem os juízes nem os demais trabalhadores do Judiciário paranaense, muito menos a população, tem direito a escolher o presidente do TJ, mantendo este como o Poder mais exclusivo do Brasil.

Cleyton Camargo simboliza o atraso político dentro do TJ, visto que faz parte de uma das mais antigas e poderosas oligarquias do estado do Paraná. Para se ter uma ideia da extensão da rede de poder desta família, vale o registro que o Visconde de Guarapuava, que hoje dá nome a uma das principais ruas da capital, era um Camargo.

Diferente do Executivo e do Legislativo que, ainda com muitas restrições, passaram por processos de abertura e democratização, o Poder Judiciário continua como um espaço fechado, anti-democrático e sem controle social. Mesmo a fiscalização do CNJ tem sido limitada, visto que acaba sendo uma fiscalização de “corporação” para “corporação”. Além disso, a mais alta “punição” aplicada pelo órgão é a aposentadoria, o que parece um paradoxo, porque na maioria dos casos a aposentadoria é um direito almejado e somente conquistado com muito esforço pela população trabalhadora.

Certa vez, quando ainda estava cursando a graduação em Ciências Sociais, o professor da disciplina “Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental e Médio” perguntou aos alunos qual era o primeiro curso superior que tinha existido no Brasil. Ao responder Direito, ele explicou: “este é um curso que forma pessoas para ocupar um braço do Estado, o Poder Judiciário”. No século XIX, só as elites faziam ensino superior e, segundo o raciocínio do professor,  eles trataram de garantir sua presença quase que exclusiva num dos três poderes do Estado até hoje.

O Judiciário também é conhecido por manter os mais altos salários dentre o funcionalismo público (apesar de não parecer, juízes e desembargadores são funcionários públicos). Apesar do vencimento básico de um desembargador girar em torno de R$25 mil (bruto), ao acessar o Portal da Transparência do TJ é fácil encontrar contracheques em que os salários ultrapassam os R$30 mil (alguns chegam a R$50 mil), além de outras vantagens. Assim como deputados e vereadores, são os desembargadores que decidem seus próprios salários, além de do orçamento e demais gastos do Poder Judiciário. Em 2012, por exemplo, o TJ/PR adquiriu um veículo para cada desembargador, cada qual com seu motorista, tudo custeado pelos cofres públicos.

A história do Poder Judiciário no Brasil mostra que precisamos avançar muito na sua democratização. Recentemente, veio a tona o debate sobre a composição do Tribunal de Contas do Estado do Paraná. Apesar da vitória de Fábio Camargo (por sinal, filho de Cleyton), o movimento pela democratização do TCE conseguiu pautar este debate na sociedade, de maneira inédita. Que a renúncia de Cleyton Camargo ajude a começar um debate sobre a tão necessária democratização do Poder Judiciário brasileiro.